sábado, 9 de março de 2013

Garçom: me vê mais pão e mais circo, por favor.


“Bilhões de dólares foram gastos em estádios e outras obras, mas nós permanecemos em barracos sem energia. Eles pediram para a gente “sentir a Copa” [expressão usada no slogan oficial do evento], mas nós não sentimos nada além da dor da pobreza piorada pela dor da repressão. O dinheiro que deveria ser gasto urbanizando as comunidades mais pobres foi desperdiçado. A Copa do Mundo vai terminar no domingo e nós ainda seremos pobres.”

Essa foi a fala de um jovem de Johannesburgo durante a Copa do Mundo de 2010, em uma reprodução de uma reportagem de Renada Neder já publicada neste mesmo blog. Reflete o sentimento de muitos sul-africanos em relação ao evento. E até agora não tenho motivos para acreditar que em nosso tão amado - e judiado - Brasil será diferente.

Afinal, devemos é ficar orgulhosos de trazer uma copa do mundo e olimpíadas, satisfeitos com o pão e circo.

Vamos fazer uma festa inigualável! Vamos nos fazer conhecidos no mundo todo por sediar festas e competições para todo mundo ver como somos alegres, extrovertidos e receptivos.

Pra quê se preocupar com os problemas agora? Isso fica pra depois, não é?

Mas no "depois" só não vale reclamar quando a infraestrutura deixar a desejar. Quando o transporte público não funcionar. Quando o sistema de ensino não for o ideal ou, ainda, lamentar as mortes nos milhares de -miseráveis- hospitais públicos espalhados pelo Brasil. Mas isso, vamos deixar para depois, não é mesmo? Agora vamos "curtir" os nossos 15 minutos de fama.

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sexta-feira, 1 de março de 2013

Uma vida reticente...


Muitos defendem a ideia de que a vida é feita de fases e deve ser superada a cada obstáculo, sem a audácia de olhar para trás. Afinal, "quem vive de passado é museu".

Discordo. A vida é feita de reticências, não de que pontos finais. A continuidade, a relação entre os acontecimentos, as revoluções de cada dia, os adventos inesperados... Tudo isso é parte fundamental de uma história única. A sua, a minha história. A do vizinho, ou de quem quer que seja.

Não obstante, o que somos e o que pensamos hoje é fruto de uma série de improváveis acontecimentos que, de tão únicos, formaram um indivíduo capaz de se diferenciar dos demais, mesmo vivendo em um mundo recheado de similaridades nos comportamentos, atitudes e opiniões. Mas não há nada tão diverso em nosso mundo quanto nós mesmos...

Aquele atraso de cinco minutos, aquela saideira, a caminhada de um quarteirão a mais... O presente inesperado, o relacionamento inacabado, a frase não dita. Uma vida não é igual à outra. Umas mais, outras menos emocionantes, é verdade...

Talvez não haja evolução humana suficiente que possa entender o motivo pelo qual todos os acontecimentos de nossa vida estejam relacionados e - talvez - tenham conspirado para forjar cada um de nós. Mas o que é fácil entender é que a natureza nos ensina que as reticências são as maiores responsáveis pela vida do que os pontos finais. Ou melhor, ...

Não é necessário um grande exercício intelectual para concordar. Há evidências de reticências em toda parte: O DNA transmitido por gerações e gerações... A constante evolução das espécies... A renovação dos ecossistemas... Os livros e legados que a humanidade insiste em deixar para trás... Tudo em nosso mundo é moldado de modo que a continuidade seja uma constante.

Por isso não há sentido em fechar portas, quebrar laços e esquecer o passado. Em todas as esferas da vida, há de se cultivar, aprimorar, evoluir. Não é preciso muito esforço. Já nascemos com o legado de dar continuidade à civilização, à família, às artes...

Há, contudo, tempo para honrar aquilo que nos faz seres únicos no meio de milhões, bilhões de similares. Valorize suas crenças. Transmita seu aprendizado, aprecie a sua história e deixe o seu legado. Por favor, não encerre sua vida. Seja reticente...
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